Tuesday, June 30, 2020
Monday, June 29, 2020
TODAS AS NOITES
Noite.
A caminho de casa. Casa em que entro. E volto a ser criança.
Onde a inocência espreita. E sou criança outra vez.
Onde a inocência espreita. E sou criança outra vez.
Onde devaneio. Onde fantasio. E me protejo.
Das intempéries e das tormentas.
Do fogo. Da paixão.
Do bem e do mal.
O cabelo, a boca, os olhos acompanham-me.
Os bolsos também.
Os bolsos também.
Trago o corpo. Sem peso.
Sem nada querer em troca.
Porque haveria de querer?
O pensamento é só.
Livre e disponível. Espontâneo.
Ilimitado como o céu.
Chego. Sento-me. No umbral.
Acaricio as flores. Saboreio o pólen.
Acaricio as flores. Saboreio o pólen.
Respiro o ar envolvente. Periférico.
Criado por um deus qualquer.
Noite após noite.
Todas as noites.
No firmamento uma estrela solitária.
Diferente. Sem igual.
Em todo o meu céu.
Diferente. Sem igual.
Em todo o meu céu.
A minha estrela. Singular.
De todas as noites. Única.
De todas as noites. Única.
Desde o princípio. Desde a minha existência.
Tão longe e tão perto.
Sensível.
Demasiadamente humana.
Enigmática.
Demasiadamente humana.
Enigmática.
Trocamos impressões.
Olhares. Sensações.
Afectos. Pensamentos.
Abraços. Todas as noites.
Afectos. Pensamentos.
Abraços. Todas as noites.
Para além do bem e do mal.
Prazeres. Mágoas.
Lágrimas. Recordações.
Lágrimas. Recordações.
Todas as noites. Inocentes.
Em silêncio.
Em silêncio.
A inocência está para além das nuvens.
As nuvens são uma janela para o amor.
A minha estrela sente. Se não sentisse não me esperava.
Todas as noites.
Todas as noites.
Se não estivesse lá, não era inocente.
E eu talvez não sentisse...
Amar é sentir as estrelas. A inocência no sentir.
A minha estrela ama. Se não amasse não sentia.
E se não sentisse, não existia o amor.
Não há amor sem inocência.
A minha estrela está à minha espera todas as noites.
Desde o princípio dos tempos. No advento da noite.
Se eu for para casa à noite, eu sei que ela está lá.
Desde o princípio dos tempos. No advento da noite.
Se eu for para casa à noite, eu sei que ela está lá.
Eu sei que ela está lá mesmo que eu não vá para casa à noite.
Sunday, June 28, 2020
SUBITEMENT ILLUMINÉ
suivre la route aux chaînes brisées
en parfaite euphonie comme auparavant
les souvenirs partagés au regard du rêveur
à toi
cette lueur
à toi
fille en fleur
Wednesday, June 24, 2020
MINGUANTE
A noite transfigurada sulca horizontes suspensos
Uma incúria febril emacia a solenidade dos plátanos
A chuva ácida fustiga a janela definitiva
O muro sem fenda resiste ao acto da primavera
Prestidigitação precária onde nada amadurece
Tuesday, June 23, 2020
TOILE
là-bas
la flamme étroite semble irréelle
glissant dans toute l'immensité
chante l'azur du cristal
glissant dans toute l'immensité
chante l'azur du cristal
les tons si transparents dans le brouillard
l’aquarelle en retard de la brise ravie
le dernier sourire du rayon blancle livre ouvert d'où je renais
mon esprit vagabond et sage
virginal
mon esprit vagabond et sage
virginal
dans son court passage
A LENTIDÃO DA ESCRITA
o lugar vazio na falésia perdida
num dia de ilusão arrastada
a transparência da lava
a lhaneza nas nuvens
a pedra inaudível que espreita
ao som do vácuo nocturno
em delírio subtil abandonado
Sunday, June 21, 2020
Friday, June 19, 2020
SUFOCO
Não distingo o fim da estrada
infelicidade desmedida
colossal tristeza
Um silêncio profundo na alma
nos ossos
não é física
é química
Thursday, June 18, 2020
Tuesday, June 16, 2020
UMA VAGA, UMA ESTRELA. Quatro passos ao longo do tempo. Um encontro inesperado imponderável fortuito extemporâneo. Ou a tristeza dentro de mim. Só em mim.
I
A alvorada acordava plena de juventude.
O silêncio ressuscitava o pólen.
Resfolgava um ar transparente, diáfano como os deuses.
O lírio inocente de sua brancura enxuta.
Um castanheiro silencioso sorria altivo.
O fresco aroma das árvores em afecto profundo.
A resina fulgia lajes de fogo em brilho delicado.
As montanhas levantavam-se e exalavam brincos de jasmim.
Uma fábula que tocava as pedras sem querer ser mais nada.
Em segredo. Entre os dedos.
Da minha vagarosa mão.
Num idioma subtil contido em mim. Só em mim.
II
Brancas são as palavras que não sabemos dizer.
Despertadas pela solidão das nuvens, pelo luar dos bosques.
A chama ateada pela neve nostálgica respira volúpia oculta.
Ao vento, esvoaçam páginas frágeis de todas as estações.
Como a elegia da mariposa que soa e passa devagar.
II
Brancas são as palavras que não sabemos dizer.
Despertadas pela solidão das nuvens, pelo luar dos bosques.
A chama ateada pela neve nostálgica respira volúpia oculta.
Ao vento, esvoaçam páginas frágeis de todas as estações.
Como a elegia da mariposa que soa e passa devagar.
Uma barca desperta inocente na noite de jade. Minha. Só minha.
III
Os grandes relógios de silêncio votados ao esquecimento.
A inércia dobra a esquina cingida ao canto do albatroz.
Onde o nome do vento é arte maior.
E a melancolia se afunda em lagos de outono.
Os grandes rios nocturnos em êxtase jazem devagar.
A crisálida em flor que respiro sobre as águas.
O longo suspiro do horizonte difuso, longínquo.
III
Os grandes relógios de silêncio votados ao esquecimento.
A inércia dobra a esquina cingida ao canto do albatroz.
Onde o nome do vento é arte maior.
E a melancolia se afunda em lagos de outono.
Os grandes rios nocturnos em êxtase jazem devagar.
A crisálida em flor que respiro sobre as águas.
O longo suspiro do horizonte difuso, longínquo.
Um testemunho tácito sem palavras numa noite minha. Tão minha...
IV
Uma rota inclinada. O vento sopra dos confins.
Em sentido derradeiro como a abóbada de um gesto.
As mãos na primeira noite.
Um, dois corpos cingidos. A janela aberta.
O mistério primitivo sem deixar rasto.
IV
Uma rota inclinada. O vento sopra dos confins.
Em sentido derradeiro como a abóbada de um gesto.
As mãos na primeira noite.
Um, dois corpos cingidos. A janela aberta.
O mistério primitivo sem deixar rasto.
A vaga hipnotizada pela estrela iluminada de candura.
O poema subitamente próximo do rosto.
Nos cabelos lúbricos da falésia. Que habita em mim.
Só em mim.
O poema subitamente próximo do rosto.
Nos cabelos lúbricos da falésia. Que habita em mim.
Só em mim.
Em segredo. Entre os dedos.
Da minha vagarosa mão.
Monday, June 15, 2020
LIBERA ME
Ausência pálida impassível de giestas
O rosto silencioso da manhã exora a liturgia das cores
Encosto-me ao poema soturno da imagem retumbante
Irrompe a sombra dos álamos na perscrutação do gesto
Um novo sedimento, uma espécie de silêncio
Despojamento voraz que resvala pelo orvalho
Sombra indigente, as mãos feridas pela erosão
Dentro de mim ardem ruas, carentes de sémen e de tom
Dentro de mim ardem ruas, carentes de sémen e de tom
Ninfas desfolhadas dançam ao som da tempestade
Fósseis e cães vadios gritam uivos lancinantes
Acato o sonho irado e procuro a voz dos duendes
Acato o sonho irado e procuro a voz dos duendes
Na véspera da metáfora suspensa no cais dos amantes
Vigília da terra fecunda do instante à nascente
Pertinaz, a palavra estremece, já com fome e sem abrigo
Um cipreste irrompe renitente à luz da vela
As vagas nuas emudecem sem exórdio e sem cor
Os uivos cedem
Já não são vadios
Porém um eco vagueia
Perde-se pelos confins
Os uivos cedem
Já não são vadios
Porém um eco vagueia
Perde-se pelos confins
Saturday, June 13, 2020
DESCRIÇÃO DE UMA PAISAGEM
Amanhecer nos olhos lívidos do sabor de Junho
Pássaros deslizam airosamente na calma púrpura
Garboso entardecer em orvalho, basalto e carmim
Lírios de plumagem cetim na face da colina cromática
A Lua guarda a noite no dorso da súplica do mar
O fio do amor adormece à beira das pérolas de luz
Friday, June 12, 2020
DESÍGNIO
As mãos cheias na noite acordada de prosa
Traduzo um idioma que levita imutável
O olhar emudece a astúcia da sombra
Quadro indefectível sem gramática na vida lenta
Thursday, June 11, 2020
DÚVIDA METÓDICA
deitado na cama. fumo um cigarro. releio “à espera de godot”. o quarto exala um cheiro vivo. perspicaz. 20:30. batem à porta. ninguém. retomo a leitura. perco-me nos diálogos. nas sílabas. na pontuação. voltam a tocar. hesito. a fraqueza domina-me. escasseia a força. o estímulo. que escala montanhas. que desbrava mares. retomo a leitura. duvido da acácia. das folhas. da terra. percurso sem regresso. paliativo da morosidade. protelação da concupiscência. adiamentos sucessivos. o atraso. a demora. tal como no livro que devoro. suspensão fora de prazo. indecisões premeditadas. indeterminismo não biológico. possibilidade insidiosa. armadilha. cilada sofisticada. a campainha volta a soar. ecoa em mim. sinto alguém. ouço passos. um odor conhecido. a sombra projectada. não reajo. insiste. recuso. viro mais uma página. a realidade escatológica. flor seca. mar insosso. deserto sem miragem. existência descolorida. onde o malabarista perde equilíbrio. e o rio já não desagua. acendo mais um cigarro. fumo que respiro involuntaria e sofregamente. instala-se a dubiedade. o equívoco. cresce. uma dúvida hiperbólica. o sabor da solidão. o estigma da ausência. a raiz do infortúnio. nada de novo. já tinha sido advertido. outrora. pelo becket.
Sunday, June 7, 2020
FILHO
Meu querido Filho
Meu enorme companheiro
Cúmplice nas artes e na vida
Confio-te a beatitude suprema
Os íntimos castelos que erigimos
A todas as intempéries sobreviverão
Reconheço os teus passos fiéis
Em cada manhã rumo às estrelas
Não há fim no nosso horizonte
Um brilho intenso perdurará
Meu querido e imenso Filho
Condenaste-me à felicidade
Meu querido e amado Filho
Sei que do nosso jardim cuidarás
Recebe de mim esta rosa
Em Sol maior plantada
Saboreia-a pétala a pétala
O sabor fausto dia a dia
(Toda e qualquer flor seca
nefasto pressagio será)
Como são parcas as palavras
Para tanto e eterno Amor
Quis o destino que nos uníssemos
Mas os ventos não são de feição
Sinto-me velho e cansado
De tão amiúde naufragar
Com certeza ressurgirá
Esse sorriso infinito só teu
O brilho apolíneo que emanas
Em uníssono com as constelações
Meu querido e ditoso Filho
Sei que te vou decepcionar
Meu querido e saudoso Amor
Muito teremos para contar
Para ti
Janelas abertas para sempre
A vastidão do mar no teu olhar
PAI
Pai
Tenho saudades Pai
E dores
Das que doem Pai
O sabor das lágrimas
É amargo Pai
Estou sozinho
Queria-te aqui agora Pai
Sentir o teu cheiro
Abraçar-te de novo Pai
Pratiquei o bem
Como desejavas Pai
Ainda creio no Amor
Mas estou ferido Pai
Porquê tanta injustiça
Demasiada tristeza Pai
Voltaremos a rir
Assim estou certo Pai
Seremos felizes
Assim prometo Pai
Estou decidido
Não me identifico Pai
Sei que compreendes
Só tu me conheces Pai
Não será por coragem
Nem por cobardia Pai
É outra coisa Pai
Aquela Coisa meu Pai
Desculpa-me querido Pai
Sei que vais concordar meu adorado Pai
PERMUTA
Folhas pisadas
O sorriso do desprezo
A renúncia pintada a carvão
Existência sem sentido
Sinto o ar gélido do fim
Assim do tamanho do mundo
NOITE ESCURA
sou dor
corpo
não voo
deambulo
vagueio
pelo fogo
bravio
afásico
flutuo
ao léu
pedra
sem destino
cal
íntimo
negro
noite
miragem
tão longe
rumo
anónimo
renúncia
cicatriz
fim
morte
Saturday, June 6, 2020
MURMÚRIO
é mesmo assim quando avistamos o fim
relembro
raras cumplicidades indissociáveis
como outrora recitava a lua enigmática
raras cumplicidades indissociáveis
como outrora recitava a lua enigmática
quando sustinha a respiração repleta de fulgência
como percepção cuidada de um verso sem tempo
os pontos cardeais da minha infância
e foi num dia casual tão só igual aos outros
que me perdi no som da escuta das veias
no silêncio que se fez sentir nas vísceras
no íntimo cristalino em forma de desilusão
um corpo vazio com asas de infortúnio
a pantera negra (de dor)
o ilusionista inábil
sem arte
um corpo vazio com asas de infortúnio
a pantera negra (de dor)
o ilusionista inábil
sem arte
apresso o passo na longa caminhada pelo bosque
onde o luar irresistível tem um sabor triste
e a solidão nua segreda ao imo do abandono
onde o luar irresistível tem um sabor triste
e a solidão nua segreda ao imo do abandono
onde a noite respira na curva dos meus ombros
encaro o infinito e sirvo a derradeira ceia
despeço-me da natureza apoteótica e sensata
a grande acompanhante de sonhos ébrios
cúmplice de fantasias e delírios em azul
foste a minha razão de existir
sem dúvida
sem dúvida
de ser
de ter sido
a quem chamei casa
celebro a tempestade
o vento
a chuva
os vales
o vento
a chuva
os vales
perco o sal
as marés
as vagas
o mar
o bálsamo da maresia
esse vaivém cativante
e sedutor
as marés
as vagas
o mar
o bálsamo da maresia
esse vaivém cativante
e sedutor
a vida
peço licença
e marco a hora
desabito o apego
e abandono o mundo
a hierofania do desejo
lugar inviolável
tocar o som
alcançar a luz
ao longo da enseada sou brindado
pela liturgia das aves
pela confissão das rochas
pela doutrina das árvores
uma filosofia longínqua
um alfabeto utópico e primitivo
pela liturgia das aves
pela confissão das rochas
pela doutrina das árvores
uma filosofia longínqua
um alfabeto utópico e primitivo
qual música intangível!
o segredo ocultado nos confins da existência
os passos indecisos sugerem o fim da estrada
sem regresso
o segredo ocultado nos confins da existência
os passos indecisos sugerem o fim da estrada
sem regresso
a perenidade é simples
genuína
imperturbável
genuína
imperturbável
verdadeira
Thursday, June 4, 2020
Wednesday, June 3, 2020
DANS CETTE IMMENSITÉ
dans cette immensité
je sens les formes si pures
qui frôlent avec passion
un sentiment nouveau
qui coule dans mes veines
un simple regard absolu
sans peine et sans contrainte
Tuesday, June 2, 2020
LA SUITE M'APPARTIENT
Mon visage nu dans les heures brûlées
les rêves de la peau me submergent
douce clarté des jours ensoleillés
à chaque fois juste une image
messages inconnus sur les voies
d’où je viens par un long cri
flots intemporels malgré les peurs
une force interne au bord des eaux
la clameur aux multiples visages
comme rarement se rapproche
par défaut le temps me change
le vieux témoignage sous mon toit
où cohabitent les nuits solitaires
Monday, June 1, 2020
EM VOZ ALTA
candura delapidada
ânimo ilegível coagido
constatação gélida do desdém
indiferente
desvanecimento da gargalhada autêntica
genuína
desencanto que trazemos no fundo
às costas
profundidade côncava
inerte o canteiro das rosas
tristes
ritual à medida do esquecimento
testemunhado
pelas nuvens intrépidas
pela alteza da montanha
pela vastidão do oceano
milenar
desequilíbrio da memória
insana
insensível
inconsequente
sinais oblíquos sem luz própria
estigma do orgulho
pudoroso
ultraje à harmonia do mundo?
talvez…
fabulo o espaço sem dinâmica
a física transfigurada
transtornada
leis indignadas
caóticas
ímpias
perplexas
relógio sem nexo
de sentido retrógrado
amputado
desprovido de ponteiros
onde repousavam as aves
onde descansava o vento
e adormeciam os justos
uma realidade inatingível
indecifrável
incognoscível
à dimensão do universo
ou da metamorfose da larva
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