Sunday, September 29, 2019

ÁTIMO




Diviso a centelha que espreita e desvenda o fulgor cujo brilho amadurece nos confins de um Sul desconhecido.

Venerada pela incandescência hipnótica do estame esguio tingido secretamente ao longo do entardecer.

A ogiva imóvel em solo fértil desvenda o esplendor essencial à ternura do jogo das sombras.

Auspicioso instante à beira da falésia imaginada.

Iluminada pelas aves. Ao som das nuvens.

Friday, September 27, 2019

HAIKU V




inlassable élan assouvi
ombres qui s’enlacent
lèvres qui respirent

HAIKU IV






spectre de la nuit
espace rêvé de lumière
quand il neige de l'or

Tuesday, September 24, 2019

DEVOÇÃO






aspiração lídima
desígnio do esquecimento 

deflagra rarefeito

não nutre o corpo
antes o espírito


Sunday, September 15, 2019

AUTOMATIC WRITING




Há dias em que a clarividência nos assalta
desmedidamente lúcida, acesa
e mostra-se com toda a sua violência

Não posso permitir-me o assalto ao que me é dilecto
naquilo em que creio
no pouco em que ainda acredito

O que estimula o exercício vital tão essencial quanto a respiração

Sinto-me ultrajado perante tanta descrença
e tamanha ambiguidade

Para me julgar basto-me a mim próprio

Resigno-me à minha mera condição itinerante
só assim me aceito e revejo

Como tal, manifesta-se toda a eloquência
só pelo facto de estar vivo
de querer estar vivo

Ousar a ostentação do ouro não é para todos
só para os astutos
ou ágeis

Caso contrário revela altivez
uma petulante presunção
de algo 

Imbuir através da razão o que o coração não vê
ou não sente
é algo em que não confio
genuinamente

A persuasão deverá ser involuntária, espontânea, intuitiva
caso contrário afigura-se como erro

Entretanto estou frágil
experimentei o sabor da abjuração
desconhecido para mim
estranho e ácido

Como se a conjuntura astral fosse a causa inevitável do desencanto
periódico
presente

Ainda que com consciência de toda a vulgaridade
protejo-me do frio, ou do calor que se esconde

O tempo escasseia
o ar rarefaz 
sufoca

Reinvento novos caminhos
com os quais sempre sonhei
e me regeneram como me reconheço

Cerro a porta ao despautério
Abro uma janela para o mar




Saturday, September 14, 2019

HORIZONTE





ao ritmo das vagas
anónimas 
ansiosas 
persistentes

não vou desestimar qualquer lei
(a violência que me espanta)
ou o epílogo do sonho tangível:

lua cheia
nuvens carregadas predizem algo

dois barcos que se cruzam 
mas logo se afastam

Tuesday, September 10, 2019

PROPORÇÃO



Em consonância
com a plenitude imensa dos sonhos

Intimidado
pela regularidade incorrigível da lentidão ostensiva
das nuvens

O silêncio vago da noite chega com tímida leveza

As palavras emudecem
A vida revela-se um esboço

Um diálogo entre luz e sombras